E porque ainda me chamam de moura encantada...

E vós, formosas mouras encantadas,

Na noite de S. João ao pé da fonte,

Áureas tranças com pentes de ouro fino

Descuidadas penteando - enquanto o orvalho

Nas esparças madeixas arrocia

E os lindos anéis de perlas touca.

D. Branca, Almeida Garrett

A Moura Encantada
As moiras ou mouras encantadas são espíritos, seres fantásticos com poderes sobrenaturais do folclore popular português. São "seres obrigados por oculta força sobrenatural a viverem em certo estado de sítio como que entorpecidos ou adormecidos, enquanto determinada circunstância lhes não quebrar o encanto". Segundo antigos relatos populares, são as almas de donzelas que foram deixadas a guardar os tesouros que os mouros encantados esconderam antes de partirem para a mourama.
As lendas descrevem as mouras encantadas como jovens donzelas de grande beleza ou encantadoras princesas e "perigosamente sedutoras". Aparecem frequentemente cantando e penteando os seus longos cabelos, louros como o ouro ou negros como a noite, com um pente de ouro, e prometem tesouros a quem as libertar do encanto.
(...)

Surgem como guardiãs dos locais de passagem para o interior da terra, os locais "limite", onde se acreditava que o sobrenatural podia manifestar-se. Aparecem junto de nascentes, fontes, pontes, rios, poços, cavernas, antigas construções, velhos castelos ou tesouros escondidos.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Moura_encantada

Já lá vão muitos anos, não sei precisar quantos, apelidaram-me de Moura Encantada. Não o entendi, demasiado jovem para alcançar a profundidade daquele pensamento, talvez. Mas o uso da palavra "Encantada" funcionou assim como uma limpeza atómica ao ego. Sabem, aquelas palavras que por muito insignificantes que sejam nos deixam os neurónios a badalar, uma excitação que só uma pré-adolescente entende? Essas mesmas...

Anos mais tarde, repetiu essas palavras, no início de uma frase:

- "Então ó Moura Encantada, lá cresceste e te fizeste uma mulher, hein?"

"Espera lá... Se agora me fiz uma mulher, ser Moura Encantada não devia ser lá grande coisa..."

Nunca gostei de ficar enterrada em dúvidas e mistérios e achei por bem investigar.
Afinal, era uma figura lendária, uma personagem das histórias que passaram de boca em boca e que ainda hoje são contadas.

Perguntei-lhe um dia "Porque me chamas Moura Encantada?"

Ele já velhote, puxou o boné para trás, olhou-me com sorriso maroto e olhar brilhante e respondeu:

-"Porque os teus olhos vão dizendo que abrigas segredos que não revelarás a qualquer um."

A última vez que o vi, foi há dois anos. Quando lá voltar, talvez já não exista, ou talvez não se recorde da Moura Encantada. Mas caramba!, olhou-me nos olhos em criança e não se enganou...