Adorável

Umas horitas a brincar com ela, operam milagres. Vim de lá bem disposta.
“Vais jantar cá?”
“Sim. Queres?”
“Quero!!” e sai a correr disparada em direcção ao quarto, para voltar em seguida:
“E dormes cá?”

Como aparecemos de surpresa e era para ser rápido, decidimos contribuir para o jantar com alguns dos artigos que tínhamos no carro (vínhamos das compras).
Falava com a X. sobre o que lá tinha, acabei por dizer que trazia para cima o pão, o camarão e a sapateira. A cachopa aproxima-se de mim quando estou de saída e diz-me: "Tia! Traz também azeitonas!"
Não dá para descrever o ar sacana com que diz estas cenas. É indescritível!

O arzinho sacana deve ter herdado de mim, mais ninguém o tem… Olha que bom! De tantas “qualidades” que tenho, ficou com a melhor de todas, sem dúvida.

A minha blusa tem umas fitinhas de cetim, que ficam penduradas pela cintura. Quando dei por isso, tinha a catraia agarrada às ditas, a entoar uma qualquer lengalenga. Só me apercebi do que era, quando a mãe me disse: "Desde o Natal, ela não se esqueceu e já faz sozinha." Então a lengalenga era algo que improvisei na noite de Natal, quando a ensinei a fazer um laço nos atacadores do sapatos e que me saiu algo assim, que ela decorou: "O coelho saiu de casa, deu a volta ao moinho, saltou para o poço e apareceu atrás da casa". Bonito ou não, pedagógico ou não, nunca pensei que ela aprendesse a fazer os laços nos atacadores por este método. No entanto, ali estava ela, a fazer lacinhos com as fitas da minha blusa. "Já que tens tanto jeito, podias ensiná-la a fazer o L maiúsculo..." Confesso que já tenho dificuldade em recordar-me da caligrafia que aprendi na escola, com todos aqueles retorcidos, mas começando por A, B, C, cheguei ao L e lá a tentei ensinar, primeiro com a mão dela dentro da minha (tarefa complicada...), depois criando uma série de pontos formando a letra, que ela lá foi conseguindo unir. Passo seguinte: o decalque... Copiar o meu L por cima da folha escrita. Já estava com o traço mais firme, quando avançámos para o "L" sem rede. Lá escreveu um belo L, ao qual pedi que fizesse mais. "Tia, agora quero escrever o meu nome!" Já sabia fazer o "L", o "a" também já o conhecia, faltava-lhe o "r". Não atinou muito bem com o loop lá no cimo, mas ao fim de algumas tentativas frustradas (que, como Touro que é, riscava em acessos de fúria por não o conseguir fazer) obteve sucesso pela persistência e escreveu um orgulhoso e retorcido Lara. Toda contente pegou no caderno e foi mostrar à mãe. "Tia! E como se escreve Sofia?" A mãe ria, como quem diz "Hoje não sais cá de casa...", mas gosto de quem gosta de aprender, não poderia nunca recusar tal pedido e dispus-me a avançar. O "S" saíu-lhe direitinho à primeira tentativa, o "o" não tem já segredos para ela. Mas o "f"... Quando desenhei o primeiro "f" ela desabafou "aii, que difícil...". Experimentei a técnica dos pontinhos, do decalque, a mão dela na minha, nada resultou para o "f" nascer daquela mãozinha. Fez beicinho e sussurrou-me: "Tia, não sou capaz... Na escola vou dizer à professora que me chamo só Lara...".

Ver Álbum Completo

E não digam que a pirralha não tem jeito para fotografar…
A modelo é que não ajudou muito.

Ver Álbum Completo

O ponto alto da noite, foi sem dúvida o comentário da C. para a X.:
"Tenho pena que a Raquel não tenha querido ter filhos..."
Troca de olhares com a X., que mais tarde me pergunta:
"Mas... isso quer dizer que tinhas autorização para pular a cerca?"
"Se tinha, não sabia... Mas sendo assim…"

Quanto mais tempo estou contigo, menos te entendo…